País tem 20 barragens sob risco, diz governo
Levantamento do Ministério da Integração aponta que há pelo menos 20 barragens que podem romper por falta de manutenção.

As enchentes de final de ano são os inimigos naturais que ajudam a potencializar o perigo. A falta de investimentos é o inimigo burocrático. Barragens como as que pertenciam ao antigo DNOS (Departamento Nacional de Obras e Saneamento) ficaram sem administrador com a extinção do órgão e estão há quase duas décadas sem nenhum tipo de reparo.

"As grandes barragens do país são bastante seguras. É praticamente impossível que uma Itaipu, por exemplo, estoure. Já as barragens menores, construídas por Estados ou municípios e sem acompanhamento de técnicos experientes, são as que apresentam maior perigo", diz Herton Carvalho, diretor-técnico do Comitê Nacional de Barragens.

O Brasil possui 840 grandes barragens, centenas de médias barragens e milhares de represas pequenas ou particulares que não recebem nenhuma fiscalização das esferas de governo.

Há dois anos, o Ministério da Integração Nacional criou o Cadastro Nacional de Barragens, na tentativa de monitorar as represas em situação de risco.

Foram enviadas 5.500 fichas cadastrais para prefeituras, governos de Estado e órgãos federais pedindo informação sobre barragens com algum tipo de problema. Apenas 300, o equivalente a 6%, responderam o formulário.

"Existe um total despreparo das prefeituras. Muitas só têm um engenheiro ou mesmo nem sabem que existem barragens no município", diz Rogério Menescal, diretor de recursos hídricos do ministério. Menescal afirma que a esfera federal não tem técnicos suficientes para monitorar todas as barragens do país.

Atravessada a barreira da fiscalização, o obstáculo seguinte é a falta de verbas para manutenção das obras. Maior construtor de barragens do país, o Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs), órgão vinculado ao Ministério da Integração, diz que não tem dinheiro para a manutenção das 326 barragens que mantém atualmente.

"Nosso orçamento anual é R$ 2,9 milhões, mas precisamos de pelo menos R$ 30 milhões", afirma a coordenadora de estudos e projetos do Dnocs, Zita Timbó. Ela diz que, com esse orçamento, o órgão consegue realizar apenas ações emergenciais nas barragens mais perigosas.

Zita Timbó alerta que o risco não se restringe às barragens públicas, mas também às particulares. De acordo com ela, só no Estado do Ceará existem 8.000 barragens pequenas que foram construídas sem fiscalização.
"Individualmente elas não são uma ameaça, mas podem provocar um efeito dominó, rompendo outras menores e destruindo uma barragem estratégica maior", afirma Zita Timbó.

Tragédia anunciada

No ano passado, os moradores do município de Alagoa Grande, na Paraíba, sentiram na pele os efeitos do rompimento de uma represa de médio porte.
A barragem do Camará, com capacidade de 26 milhões de m3, construída pelo governo do Estado da Paraíba, rompeu em junho, matando cinco pessoas e deixando mais de 4.000 desabrigados.

Pelo menos mil pessoas continuavam sem casa 12 meses após o acidente no Camará.

A Paraíba continua convivendo com outros pontos de risco. As barragens de Timbaúba, no município de Juru, e de Poleiros, em Barra de Santa Rosa, ambas mantidas pelo governo do Estado, ameaçam a população que mora abaixo das represas.

Duas comportas da barragem de Timbaúba têm vazamento. Além disso, uma delas está emperrada, comprometendo o escoamento no período de cheia.

Risco à vista

O secretário de agricultura de Juru, Gilson Batista, diz que o rompimento da barragem alagaria todo o centro da cidade, incluindo o prédio da prefeitura e o hospital municipal.

A represa fica a um quilômetro do município, que tem 10 mil habitantes, e preocupa principalmente no período das chuvas, que vai de janeiro a maio.

"Há três anos estamos informando o problema aos técnicos do governo. Eles prometem que vão resolver, mas não fazem nada", afirma Batista.

Em Barra de Santa Rosa, a barragem de Poleiros sofreu erosão e tem rachaduras em sua parede principal. O prefeito Evaldo Costa Gomes calcula que o possível rompimento alagaria boa parte da cidade, que tem 14 mil habitantes. O município fica no sertão árido da Paraíba. Sem a barragem, também perderia sua principal fonte de água.

"Eu visitei o local, fotografei e fizemos um ofício para a secretaria do Estado. Mas, até agora, nenhuma providência foi tomada", reclama o prefeito Gomes.

20 anos às moscas

O gerente de fiscalização da Agência Executiva de Gestão das Águas da Paraíba, Helton Cruz, justifica que o Estado tem um histórico de 20 anos sem nenhuma grande ação de recuperação de barragens. "Estamos fazendo o que é possível. Algumas represas já foram reparadas, mas outras estão à espera de recursos", diz.

No Rio Grande do Norte, também numa região castigada pela seca, a barragem José Batista Rêgo, do município de Poço Branco, está há sete anos com duas comportas vazando. A represa tem capacidade para armazenar 136 milhões de m3 de água, e um eventual acidente deixaria debaixo d'água as cidades de Taipu e Ceará-Mirim, no interior do Estado.

"Quando o DNOS foi extinto, a barragem ficou sem manutenção. Os funcionários foram se aposentando e ela acabou abandonada. Hoje, ninguém sabe de quem é a responsabilidade", diz a prefeita interina de Poço Branco, Nilce Cavalcanti. Ela diz que o município jamais teria dinheiro para a obra necessária, mas que o ministro Ciro Gomes (Integração Nacional) prometeu liberar verbas ainda neste ano.

Outra barragem perigosa fica no município de Porto Murtinho, Mato Grosso do Sul, quase divisa com o Paraguai. O dique que protege a cidade do rio Paraguai apresenta erosão e infiltrações em vários pontos e corre o risco de estourar na próxima cheia.

Promessa de verbas

No ano passado o prefeito da cidade, que tem 13 mil habitantes, decretou estado de emergência por causa da insegurança. "O dique forma uma bacia, e nós estamos dentro dela. Se romper, a cidade toda fica debaixo d'água", diz o secretário de Governo do município, Carlos Heyn.

Desde que foi construído pelo governo federal, em 1985, o dique nunca passou por manutenção. Neste ano o Ministério da Integração Nacional prometeu liberar R$ 2,7 milhões para as obras.

No Piauí estão duas outras barragens em situação perigosa --o dique do rio Poti, na capital Teresina, e o açude Joana, no município de Pedro 2º. O dique do rio Poti já rompeu em 1985, deixando 120 mil desabrigados. Em 2004, ameaçou causar novo acidente. "A situação foi contornada em seu limite mais extremo", conta o diretor da Defesa Civil do Piauí, Hernando Cardoso.
Data: 30/11/2005
Fonte: AcquaVip



 
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