No sertão da BA, Paraguaçu sofre com poluição e falta de matas ciliares
Quando os índios batizaram o rio, escolheram um nome que desse a ele a noção do seu tamanho. Uma palavra bastou: Paraguaçu, que significa ‘água grande’, em tupi guarani.

Em Itaetê, as águas do Paraguaçu foram represadas pela barragem Bandeira de Melo, que tem a missão de evitar que o leito do rio seque quando a chuva falta. Uma represa de 24 quilômetros de comprimento.

Dali em diante, o Paraguaçu atravessa a região que mais depende de suas águas. Por uma triste ironia, é também a região que mais agride o rio.

Nas cidades ribeirinhas a mesma água que mata a sede e a fome, recebe poluição de todo canto. Do jeito que sai das casas e das ruas, a sujeira cai na água. O caramujo, transmissor da esquistossomose, está por todo canto.

Um motor de 30 cavalos faz a água chegar na parte mais alta de uma propriedade. De dois reservatórios, ela desce por gravidade para irrigar a plantação lá embaixo em um assentamento da reforma agrária. Um dos primeiros, no médio Paraguaçu, a receber água do rio para molhar a terra.
A área do assentamento é de 360 hectares divididos entre 25 famílias. O carro-chefe do assentamento é a produção de banana e a irrigação por gotejamento cumpre bem a função de molhar a terra sem desperdiçar água.
Boas colheitas, prosperidade em terras da seca. O rio que faz brotar a comida, em troca recebe a ingratidão.
Na região da caatinga, o pasto só não invadiu o curso das águas, como a mata ciliar desapareceu. Resultado: a erosão tomou conta do leito e a margem do rio começou a desbarrancar.

Por causa da falta de proteção das matas ciliares, vários afluentes já morreram na região da caatinga. Um riacho, de tão assoreado, não vê água nem em época de chuva. O Paraguaçu, logo adiante, não recebe nenhuma contribuição do parceiro há mais de 10 anos.

Carlos Romero dirige uma organização não-governamental, a SOS Paraguaçu, que há mais de uma década vem denunciando essas agressões. De acordo com estudos recentes, a devastação da mata ciliar chega a 70% da extensão do rio. Isso significa cerca de 400 dos 614 quilômetros do Paraguaçu.

De um lado, São Félix, na margem direita. Do outro, Cachoeira, cidade monumento, patrimônio nacional. Boa parte da vida passa pela antiga ponte de ferro, famoso cartão postal da Bahia. Tem 365 metros e por muitas décadas era a mais importante ligação, por terra, entre o sertão e o litoral. Foi construída em um estaleiro da Inglaterra, por encomenda de Dom Pedro II. As águas do Paraguaçu foram testemunhas das batalhas que consolidaram a independência do Brasil.

Os baianos aprenderam com os índios a arte de produzir cerâmica. Em Coqueiros, distrito de Maragogipe, a comunidade ribeirinha abriga uma autêntica representante da arte de moldelar barro.

Lá se vão 80 anos de batalha. Dona Cadu hoje tem 91 e desde os 11 mexe com o barro. As peças são tão bem feitas, tão bem acabadas, que a impressão que dá é que foram polidas em um torno. Mas é só impressão mesmo, porque Dona Cadu não usa nenhum equipamento além das mãos, prá lá de habilidosas. Companhia? É só olhar pela janela e lá está ele, o seu velho amigo. O Rio Paraguaçu.

Algumas comunidades que ficam afastadas do leito do rio só saíram do isolamento graças a um meio de transporte rústico, de fabricação caseira e movido a vento. O famoso saveiro baiano.

Hoje em dia, à medida que as estradas chegam, o trabalho dos saveiristas vai diminuindo. Há 80 anos, mais de mil saveiros navegavam pelas águas. Hoje, reunindo todos eles, a frota não passa de 20, mas há uma esperança. Recentemente, o saveiro foi tombado como patrimônio imaterial do Brasil.

Preservar o Paraguaçu é uma obrigação de todos que dependem dele: do governo do estado, das cidades ribeirinhas, que não tratam o esgoto, dos moradores que sujam o rio, dos produtores, que usam a irrigação, dos turistas, que frequentam as belas paisagens do rio.

Esse rio tão importante para a Bahia merece o respeito devido.
Data: 27/02/2012
Fonte: Globo Natureza



 
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